sexta-feira, 20 de novembro de 2009

LEITURA: Doces Delicadezas do Brasil

Senhoras e senhores, fosse eu um espírita kardecista e colocaria na lápide do meu túmulo a inscrição: “Vou ali e já volto”. E voltaria mil vezes para o Brasil. Como, porém, me foi reservado outro destino no Orum misterioso, contento-me em viver ao máximo esta minha pequena passagem pela terra da qual levarei, na memória ancestral, somente as delicadezas.

Se alguém me pergunta do que mais sentirei saudade, respondo sem titubear: sentirei saudade dos doces brasileiros, responsáveis por adoçar a vida, por vezes amarga, que levamos cá nos trópicos. Saudades do mungunzá, da canjica, da pamonha, do pé-de-moleque, da paçoca – tão queridos nas comemorações de Santo Antônio, São João e São Pedro...

Sentirei saudades da tapioca molhada, da geleia de araçá, do licor de rosa, do sorvete de mangaba, do quindim, da cocada, do suspiro. E também da rapadura, da goiabada com queijo, do pudim de leite, do doce de laranja cristalizado, do doce de abóbora, da ambrosia, do abricó, da marmelada e do sonho-de-freira.

Aprendi a doçura brasileira na cozinha da avó. Fui uma criança suja de açúcar a ajudar no preparo dos quitutes com os quais as visitas se refastelavam no meio da tarde. Hoje, na idade adulta, sigo pecando contra a dieta e contra a nutrição científica, mas não peco contra o paladar: não há banana crua que seja superior em gosto a uma banana assada com canela. Sou devoto do açúcar.

Não por acaso, o livro de Gilberto Freyre que mais gosto não é o clássico Casa Grande & Senzala, mas o pouco lembrado Açúcar – uma sociologia do doce, publicado originalmente em 1939. É a primeira obra a tratar a culinária brasileira como um gesto tão identificador de nossas raízes quanto o samba e a macumba.

Lembro-me, vagamente, de uma preta velha que vi um dia, pregando na zona portuária do Rio de Janeiro, com um tabuleiro repleto de doces. O pregão parecia um lamento africano e trazia certa tristeza numa palavra desconhecida para mim: “Eh, alfenim! Eh, alfenim!”.

Anos mais tarde, descobri que alfenim era uma massa de açúcar que, levada ao forno, podia ser moldada e ganhava formas de peixe, cachimbo, estrela, chapéu ou coração. Ficou sendo, aquela mulher, a personificação da culinária brasileira: doce, ancestral e delicada.

No caso específico dos doces, o que chamamos de “alma do Brasil” parece estar ainda mais presente nas velhas receitas de família. Como diz Gilberto Freyre, “numa velha receita de doce ou de bolo há uma vida, uma constância, uma capacidade de vir vencendo o tempo sem vir transigindo com as modas”.

É assim que eu quereria a minha vida: doce e eterna, como a receita do alfenim que a preta velha ainda apregoa no cais generoso da minha infância.

Retirado do blog:www.botequimdobruno.blogspot.com

3 comentários:

Anônimo disse...

QUE ISSO INTERESSA QUANDO VAO COLOCAR COISA QUE INTERESSA A CATEGORIA

Anônimo disse...

QUE IDIOTA NÃO SEI O QUE ISSO AJUDA PRO SINDICATO!

Anônimo disse...

O anônimo da letra grande podia ocupar um pouco do tempo que passa enchendo a saco no blog, criticando tudo, para aprender a escrever. Esses comentários além do conteúdo desagradável, sempre rancoroso e mal-humorado, ésão horríveis de ler, com essa letra grande e sem pontuação. Oh anônimo, é tão crítico dos outros, que tal um pouco de auto-crítica, heim?